segunda-feira, 17 de julho de 2017

Política, Ética e Religião

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Primeiramente, considero haver em nós certas noções primitivas, as quais são como originais, sob cujo padrão formamos todos os nossos outros conhecimentos.
Descartes 



É possível que o iluminismo seja mais significativo por suas conquistas políticas. Durante aquele período, ocorreram três diferentes revoluções: a revolução inglesa, a norte-americana e a francesa. Enquanto os filósofos iluministas começaram a direcionar o pensamento para a natureza humana e se tornaram críticos em relação ás verdades estabelecidas pela Igreja e a monarquia, a atmosfera sociopolítica também passou a ser examinada.
Os simpatizantes das revoluções consideravam que a autoridade política e social estava fundamentada em tradições obscuras e em mitos religiosos e, assim, começaram a divulgar ideias de liberdade, igualdade, direitos humanos e a necessidade de um sistema político legítimo. Os filósofos não apenas criticavam o governo, mas também criavam teorias de como deveriam ser. É a partir desse momento que as pessoas começam a adotar ideias como direito à liberdade religiosa e a necessidade de um sistema político com limites e contrapartidas. Nessa época, os trabalhos de John Locke e Thomas Hobbes foram os mais influentes.
Conforme a perspectiva política e social começou a mudar, também as pessoas transformaram a própria visão a respeito de ética e religião. Com o crescimento da industrialização e urbanização, assim como das guerras sangrentas em nome da religião, as pessoas (e, com certeza, os filósofos) começaram a questionar a motivação por trás da felicidade, da moralidade e da religião. Em vez de buscar a felicidade na união com Deus ou na determinação do que torna algo bom de acordo com a religião de cada um, os filósofos voltaram-se para a natureza humana e fizeram perguntas como: O que torna alguém feliz nesta vida?
Os filósofos iluministas voltaram-se para a religião com objetivo de livrá-la da superstição, do sobrenatural e do fanatismo (hoje muito evidente em igrejas de caráter neopentecostais), defendendo um modelo mais racional. A raiva contra a Igreja Católica cresceu e o protestantismo começou a se tornar mais popular. Durante o Iluminismo, a religião começou a assumir quatro formas:

1. Ateísmo: a ideia, proposta por Denis Diderot, de que os humanos não devem buscar um ser sobrenatural para descobrir os princípios da ordem natural,mas em vez disso, procurá-los dentro de si mesmo em seus processos naturais. O ateísmo era mais comum na França durante o Iluminismo do que em qualquer outro lugar.

2. Deísmo: essa crença de que há um ser supremo que criou e governa o universo e que tinha um plano constante para a criação desde o princípio; porém, o ser supremo não interfere com as criaturas. O deísmo é mais comumente associado como a religião do Iluminismo. O deísmo rejeita a ideia dos milagres e revelações especiais e, em vez disso, argumenta que a luz natural é a prova real de que existe um ser supremo. Os deístas rejeitam a divindade de Jesus Cristo e, ao contrário, propõem que ele seja visto como um excelente professor moral. Essa teoria também possibilitou descobertas nas ciências naturais, por acreditar que Deus criou a ordem.

3. Religião do coração: é a crença de que o Deus associado ao deísmo é também racional e distante das lutas constantes da humanidade (e, dessa forma, não serve ao propósito da religião que supostamente deveria servir). A religião do coração, adotada especialmente por Rousseau e Shaftesbury, apoia-se nos sentimentos humanos. Embora, às vezes, seja considerada uma forma de deísmo, a religião do coração é uma religião "natural", notável pela ausência de "formas artificiais de adoração" e fundamento metafísico. Em seu lugar, a ênfase real recai sobre as emoções humanas.

4. Fideísmo: um dos trabalhos mais importantes surgidos no Iluminismo foi o livro Diálogos sobre a religião natural, de David Hume (um ateísta). Publicado em 1779, após a sua morte, a obra critica a suposição de que o mundo foi criado e é de autoria de um ser supremo porque o ser humano e a razão existem. O fideísmo afirma que o racionalismo crítico não consegue eliminar a crença religiosa porque ela é muito "natural". Essencialmente, de acordo com o fideísmo, um indivíduo não precisa de razões para sua crença religiosa; tudo de que precisa é sua fé. Algumas formas de fideísmo vão mais longe e afirmam que as crenças religiosas podem ser legítimas mesmo que se oponham ou entrem em conflito com a razão. Com essa rejeição ao pensamento tradicional e preestabelecido pelos gregos antigos e com sua ênfase no conhecimento humano e na razão, O Iluminismo revolucionou completamente a maneira como as pessoas viam a filosofia, a ciência, a política e a sociedade como um todo e mudou para sempre os rumos da filosofia ocidental.
Assim, o texto anterior, baseado nos princípios de uma religião medieval defendida pela filosofia cristã se opõem, de certa forma, ao pensamento moderno levantado pelos principais precursores do Iluminismo, quanto atual leitura da religião cristã mo período moderno. 
Por fim, é relevante relembrar que durante a Idade Média a filosofia cristã defendia a tese de que a fé e a razão eram inseparáveis, oposição ao Iluminismo que caracteriza, segundo David Hume que o indivíduo não precisa de razões (razão no estrito termo da palavra) para suas crenças religiosas. Apenas da fé. 

Referencias Bibliográficas:

MARCONDES, Danilo. Textos básicos de Filosofia. Rio de Janeiro: Zahar.
TRUC, Gonzague. História da Filosofia - o drama do pensamento através dos séculos. Trad. Ruy flores Lopes e Leonel Vallandro. Porto alegre: Globo, 2006.

domingo, 16 de julho de 2017

Cristianismo, Filosofia e a Pratística

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Deus e as coisas que são de Deus são em tudo melhor.
Platão


Muitas são as discussões acerca da ligação entre cristianismo e a Filosofia, ou seja do cristianismo filosófico.
Para alguns especialistas o cristianismo é uma Filosofia, enquanto outros defendem a ideia contrária, afirmando que o cristianismo não é uma Filosofia.
Sabe-se que a Filosofia baseia-se na razão e o cristianismo origina-se na palavra de Deus e ensinamentos de Jesus, transcritos na Bíblia.
No cristianismo, ao morrer e ressuscitar, Jesus Cristo tornou-se redentor dos seres humanos. Na Filosofia, contudo, existe uma relação em vida entre mestre e discípulo.
Por outro lado, o cristianismo não tem a pretensão de ser uma filosofia racional, o que está claro com a ideia da santíssima trindade (doutrina cristã que professa um único Deus, preconizado em três pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo).
Outra diferença é que, na Filosofia, busca-se a verdade através da razão; já o cristianismo está centrado na fé em Jesus Cristo, o que estabelece uma caráter histórico à religião.
Apesar de aparente separação entre a Filosofia e o cristianismo, alguns líderes religiosos baseiam-se nas teorias dos filósofos para elaborar suas próprias doutrinas religiosas. (tome por base alguns papas como Bento XVI - catedrático em Filosofia e mais de seiscentos artigos, dos quais a maioria acerca da Filosofia e da religião). São Tomás de Aquino, por exemplo, utilizava-se alguns conceitos elaborados em Aristóteles.
Isso acontecia porque, durante a Idade Média, a Filosofia grega foi muito importante para a Igreja, pois, por meio do estudo dos filósofos clássicos, os líderes religiosos conseguiram dominar e/ou destruir os descendentes na fé. Assim, a Igreja utilizou-se de meios racionais e lógicos, em seu favor, para, logo depois, fazê-los acreditar e aceitar a fé cristã.
O cristianismo apresenta sim uma dimensão reflexiva e teórica. Os dogmas da fé cristã, por exemplo, procuram explicar certos elementos de nosso estado humano.
Nesse sentido, o cristianismo não é uma Filosofia propriamente dita, nos moldes que a conhecemos, porém o pensador cristão deve tratá-lo com coerência racional, em função da Filosofia.

A Filosofia patrística (Filosofia cristã)

A Filosofia patrística predominou no período  de decadência do Império Romano, durante o século III.
Essa é uma Filosofia cristã constituída pelo conjunto de pensamentos do clero da Igreja católica desse período, ou seja, consiste em uma visão racional dos princípios religiosos do catolicismo, na formalização doutrinal das verdades da fé do cristianismo contra as visões contrárias à fé católica, às quais eles chamavam de heresias.
As ideias veiculadas na Filosofia patrística procurava explicar a relação existente entre a fé e a razão, a natureza do divino, a importância da moral na vida humana. Nesse conjunto, os autores também davam extrema importância à alma.
Para o clero que representava a patrística, era de suma importância que o povo conseguisse controlar a paixão com racionalidade, além de ser imprescindível ter uma ética rigorosa.
A Filosofia patrística inspirou-se na grega, afirmando ser a expressão terminada da verdade, não obtida pelos filósofos gregos que a buscavam. Para esses pensadores religiosos, a verdade não havia sido respondida pelos gregos porque Deus ainda não havia se manifestado, e para a patrística, Deus é a única e soberana VERDADE.

O notório representante da Filosofia patrística: Santo Agostinho

Entre os principais e mais conhecidos representantes dessa Filosofia estão: Clemente de Alexandria (aproximadamente 150 a 215), Orígenes e (aproximadamente 185 a 253) Tertuliano (aproximadamente 155 a 222). Contudo, seu representante mais notório é Aureliano Agostinho (354 a 430), mais conhecido como Santo Agostinho.
Filho de Patrício, Agostinho foi criado em uma atmosfera extremamente fervorosa nos moldes da fé cristã.
Na juventude, quando esteve em Cartago para se aprofundar nos estudos, Agostinho viveu de forma bastante desgarrada, sem se importar com os princípios proclamados pelo cristianismo e caindo em profunda sensualidade e luxuria. 
Bastante inteligente e com uma excelente oratória, após terminar os estudos abriu uma escola em Cartago e passou a lecionar retórica. Posteriormente, lecionou em Roma e, em 384 em Milão, abandonando a carreira dois anos mais tarde, em 386 por motivos de saúde e mais tarde por questões religiosas e espirituais.
Agostinho, ainda na juventude, foi fortemente influenciado pelo maniqueísmo, corrente filosófica-cristã cujo fundamento é a dualidade: bem e mal, claro e escuro, etc. Os maniqueístas acreditavam que sua Filosofia era o verdadeiro cristianismo.
Mais tarde, já maduro e realizando um exame crítico de si mesmo, Agostinho teve contato com a Filosofia neoplatônica,  abraçando-a e abandonando o maniqueísmo.
O neoplatonismo é uma corrente filosófica que promoveu uma releitura do pensamento de Platão. A essência dessa filosofia era, contudo, uma visão cristã romana.
Os neoplatonistas pretendiam fortalecer o cristianismo, identificando e associando o pensamento de Platão a essa religião, misturando razão e fé, pois, para eles, ter fé é antes de mais nada uma ato de razão.
Eles justificavam os dogmas católicos pela razão e divulgavam que era necessário primeiro conhecer para depois crer. 
Ao ler as epístolas (cartas) do apóstolo Paulo na Bíblia, Agostinho acreditou ter recebido uma revelação divina, pois suas dúvidas desapareceram. Assim, influenciado pela mãe, pelo neoplatonismo e por essa revelação, ele abraça a fé cristã, batizando-se em 387.
Em seguida, Agostinho voltou para a África, onde se dedicou aos estudos e orações.
Agostinho foi ordenado sacerdote, e, em 395, sagrado bispo,na cidade de Hipona, na África, onde teve grande atuação episcopal. Em 397, escreveu a obra Confissões e, em 426, terminou de elaborar outra, a conhecida Cidade de Deus.
Agostinho faleceu em Hipona no ano de 430. Ele é considerado o maior representante da Filosofia patrística; e sua obra é tida como extremamente relevante para o cristianismo, pois ele se posicionava contra as heresias e a culpa que os pagãos tentavam impor ao cristianismo pela invasão de Roma em 410.
Para Agostinho, o ser humano tem em sua essência uma inclinação para o mal, pois já nasceu como pecador, devido ao pecado original de Adão e Eva, narrado na Bíblia.
Tanto é a importância do pensamento filosófico cristão de Agostinho que o Papa Emérito Bento XVI, o 265º na atual hierarquia, - o qual considero o Papa mais intelectual da Igreja Católica - "bebe" em seus artigos e encíclicas do legado cristão de Agostinho. Afirmando que razão e fé são indissociáveis 

Referencias Bibliográficas:

ARISTÓTELES. Arte retórica e arte poética. Rio de Janeiro: Ediouro, 1993.
AGOSTINHO, Santo. A cidade de Deus. São Paulo: Vozes, 2014.
BORNE, Étienne. O problema do mal: mito, razão e fé. São Paulo: É Realizações, 2014.
BENTO XVI. O último testamento. São Paulo: Planeta, 2017.
FRANCISCO, Papa. O Papa da simplicidade. Rio de Janeiro: Agir, 2017
KARNAl, Leandro. Pecar e perdoar: Deus e o homem na História. Rio de Janeiro: Harper Collins, 2015.
REBINSKI, Marcelo. Paulo: o apóstolo da ironia: Suas cartas e a propagação do cristianismo. Revista de História. São Paulo: Unicamp, 2016.


sábado, 15 de julho de 2017

O que é a verdade?

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A verdade para o homem é o que faz dele um homem.
Saint-Exupéry


Todos nós, em algum momento de nossa vida, já nos perguntamos o que é a verdade. Os filósofos sempre refletiram sobre essa questão, buscando-a incessantemente, sendo essa a primeira busca da Filosofia.
Normalmente, surge dúvida em nossos pensamentos e, ao encontrarmos uma resposta para essa dúvida, seja por meio de deduções lógicas ou de alguma experiência sensível, acreditamos que encontramos a verdade. Nesse caso, podemos dizer que encontramos pensamentos, acreditamos como real; porém, para ser verdade, é necessário que todos, ao duvidarem, cheguem ao mesmo denominador comum, ou seja, a verdade universal, se assim não o for não é verdade, é uma "falsa verdade".
Podemos dizer que a busca da verdade dá sentido para a nossa existência, enquanto a falta dela leva o ser humano a desiludir-se.
O filósofo busca o conhecimento, busca a verdade, e, uma vez alcançada essa verdade, ela torna a fugir indefinidamente. O filósofo procura respostas para os problemas universais de todos os seres humanos; dentre eles, o que mais nos impressiona é justamente saber o que é a verdade. Porém, a Filosofia, apesar de ser conhecida como a busca da sabedoria, do conhecimento, não tem uma resposta pronta para definir o que é a verdade final, a verdade última.
O Dicionário de Filosofia de Cambridge apresenta a seguinte definição para verdade "qualidade daquelas proposições que estão de acordo com a realidade, especificando aquilo que realmente se trata".
A verdade filosófica busca explicações, interpretações e significados para aquilo que conhecemos como realidade.
Para o filósofo Descartes, a verdade é: "Penso, logo existo", ou seja, a consciência do pensamento é uma verdade inquestionável. Ele questiona tudo o que conhecia, tudo o que sabia, utilizava-se do método da dúvida para chegar a essa verdade.
Descartes, com sua dúvida metódica, afirmava que somente poderia aceitar algo como verdadeiro se fosse indubitável, se não pudesse questionar por meio do pensamento genuíno; portanto, para ele "penso, logo existo" é a única verdade, pois mesmo que alguém duvide do que pensa, de qualquer forma estaria pensando. Então, essa consciência do pensamento é verdadeira.
Para o filósofo Sócrates, famoso pela frase "só sei que nada sei", a verdade era alcançada pelo próprio indivíduo, que por meio de seu método de questionamento, a ironia e a maiêutica, ao final, concebia suas próprias ideias, sendo estas últimas as verdadeiras, genuínas e autênticas, alcançando assim o conhecimento, a verdade.
Platão, em seu texto "O mito da caverna", assim escreve:

A caverna subterrânea é o mundo visível. O fogo que ilumina é a luz do sol. O acorrentado que se eleva à região superior e a contempla é a alma que se eleva ao mundo inteligível.[...] Nas últimas fronteiras do mundo inteligível, está a ideia do bem criador da luz e do Sol no mundo visível, autora da inteligência e da verdade no mundo invisível e sobre a qual, por isso mesmo, cumpre ter os olhos levantados para agir com sabedoria nos negócios individuais e públicos.

Para ele, o homem necessita sair das sombras, "sair da caverna" para se libertar da ilusão, pois as sombras da caverna apresentam apenas a superfície sombria da realidade, da aparência; para se alcançar a verdade é necessário caminhar em busca do conhecimento.
Assim, para Platão, o ser humano não conhece a verdade tão facilmente; precisa buscá-la a cada dia, pois, se não a buscar, ficará sempre nas sombras, acreditando que ali se encontra a realidade e a verdade.
Para Platão, os filósofos, por serem "buscadores da verdade", são os mais aptos e únicos seres que podem atingir o mundo das ideias, do conhecimento  verdadeiro, da realidade. Para esse pensador, a dialética era o instrumento utilizado para se atingir o conhecimento científico.
Em Aristóteles, para chegar à verdade, era necessário percorrer quadro degraus: o da ignorância, o da dúvida, o da opinião e o da certeza.
Para São Tomás de Aquino, "a verdade é a adequação do pensamento à coisa real".
Portanto, cada filósofo define a verdade de uma maneira particular, dependendo de sua época, de sua visão de mundo e de qual escola filosófica influenciou seu pensamento; porém, todos buscam essa verdade incessantemente.
Em todas as áreas do conhecimento humano, busca-se a verdade. Na ciência, ela é atingida quando se tem um conhecimento total ao mundo. Na metafísica, a verdade é o ser; na lógica são as ideias sem falhas de raciocínio; para a religião, é a manifestação ampla e total da divindade.
Desse modo, é difícil conceituar a verdade. Ao longo do tempo, cada pensador acredita em sua verdade. Cada um tem uma maneira própria para buscá-la. Nesse sentido, cada um tem uma visão parcialmente única da verdade. Não existem, porém, várias verdades, cada um tem a sua. Isso significa, simplesmente, que se deve procurar a verdade incessantemente, e que nenhum sistema que se firme como verdadeiro pode de fato ser, pois nenhum trata inteiramente da realidade sem torná-la inquestionável.
Portanto, meus caros leitores, a verdade para a Filosofia é questionável, é a busca do conhecimento pessoal e racional. Como diz meu apreciado filósofo alemão, Friedrich Nietzsche, "não há fatos eternos, como não há verdades absolutas. 


Referencias Bibliográficas:

ARISTÓTELES. Coleção Os pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 2004.
NIETZSCHE. A Gaia da Ciência. São Paulo: Editora Leya, 2016.
PLATÃO. A República. São Paulo: Nova Cultural, 2004.





terça-feira, 27 de junho de 2017

Podemos falar em leis morais absolutas?

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 "A verdade científica é maravilhosa, mas a verdade moral é divina"
Horace Mann (1796-1859)


A noção de absolutismo moral supõe a existência de certas ações que são totalmente certas ou totalmente erradas, em quaisquer circunstâncias. Essas leis usualmente estão associadas a direitos e deveres e apontam para um princípio que nunca deve ser transgredido. Uma lei moral absoluta tem probabilidade maior de ser encontrada num contexto religioso, especialmente nas religiões bíblicas, mas também pode ter uma aplicação secular. Ela pode ser absoluta, às vezes por século, mas geralmente deixa de sê-lo. 
Na Idade Média uma apóstola ou herege que se recusava a desmentir sua condição morreria queimado: a lei era inflexível. Mas na sociedade ocidental contemporânea a lei não reconhece tais crimes.
O modelo de lei absoluta costuma ter os Dez Mandamentos registrados no Antigo Testamento (Êxodo20:2-17) como imperativos, por exemplo: "Honra a teu pai e a tua mãe", Não matarás", "Não cometerás adultério", "Não roubarás", e assim por diante. Contudo, cada uma dessas leis perdeu o absolutismo de uma lei pela forma de punição prescrita por descumpri-la. Em muitas partes do mundo a pena capital continua sendo apicada em casos de assassinatos, "olho por olho, dente por dente", implicando que tanto a lei quanto a sansão são absolutas. Mas a lei contra matar não é mais absoluta, visto que há diferentes tipos de assassinato definidos de acordo com o motivo, provocação e premeditação. O mesmo vale para outros crimes anteriormente considerados como transgressão de uma lei absoluta, como roubo ou adultério.
No ocidente, o absolutismo moral não é mais definido por lei, e sim  por um ideal. Em algum lugar nas formulações dos Dez Mandamentos e do labirinto infinito de leis geradas por eles, existe um duro núcleo moral que não pode ser gradualmente reduzido. Conhecido como Regra de Ouro, ele se espalhou pelos nossos sistemas éticos da antiga Babilônia até o humanismo secular moderno. É uma regra de reciprocidade que, afirmada positivamente, exige que você trate os outros como gostaria de ser tratado, e negativamente que evite tratar os outros como não gostaria de ser tratado (frase que inclusive escrevi no texto anterior sobre moralidade). O Rabino Hill (110 a.C - 10 d.C) respondeu quando lhe pediram para resumira lei judaica: "o que lhe odioso , não faça ao seu próximo. Isto é a Torá, toda ela. Todo resto é comentário; vai e estuda."Ou em termos cristãos: "Amarás ao teu próximo como a ti mesmo". Em seu sermão de despedida, Maomé disse: "Não feri ninguém porque assim ninguém vos ferirá". O Tema continua ao longo da filosofia moral ocidental, sendo o ponto fundamental do que era provavelmente o imperativo categórico de Kant.
A primeira formulação dele é: "Age só segundo máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal." Isto é seguindo de perto por "Age de tal maneira que possa usar a humanidade, tanto em tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim, e nunca simplesmente como meio."
A formulação dos princípios morais básicos delineados anteriormente por Kant não se soma para formar um objetivo moral absoluto, mas representa um ideal, um mínimo denominador comum de relacionamentos civilizados. Uma moral absoluta pode apenas ser mantida pela pessoa que a adote: não pode ser aplicada a mais ninguém e continuar sendo "moral",. Como avisou Pascal: o mundo é governado pela força, não pela opinião; mas a opinião usa a força."
E, eu fico convencido cada vez mais que a "moral absoluta." É relativa...


Referencias Bibliográficas:
Hobbes, Thomas, Leviatã, Ícone Editora, 2008.
Hume, David, Tratado da natureza humana, Unesp, 2009. 
Kant ,Immanuel, Crítica da razão prática, Nova Fronteira.
Locke, Jhon, Investigações sobre o entendimento humano, UNESP, 2004

sábado, 10 de junho de 2017

Precisamos de um código moral?

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                                                 "Não seja moral demais. Você pode boicotar de muita coisa na vida. Mire acima da moralidade. Não seja apenas bom, e sim útil."
Henry David Thoreau (1817-1862)




Antes de iniciarmos, pode ser útil fazer uma distinção entre moralidade e ética. No uso comum das palavras são intercambiáveis, mas existem diferenças importantes. Em termos amplos moralidade se refere ao comportamento individual que pode ou não obedecer e aceitar padrões, enquanto a ética está preocupada com o comportamento social, julgado pelos princípios de um sistema ético. Existem formas de comportamento aceitáveis em situações privadas ou dentro de um grupo familiar que seriam inaceitáveis num contexto mais amplo. As duas palavras se preocupam como o comportamento comum, o jeito como as pessoas fazem as coisas, e ambos implicam um padrão. A moralidade tenta determinar se um comportamento é "bom" ou "mau", enquanto a ética se preocupa com o estudo deste assunto. Existe uma ramificação da ética chamada "ética normativa", cujo objetivo é determinar o que devemos ou não fazer num contexto social, e nosso comportamento é comparado em relação a esse padrão implícito, sendo considerado "certo" ou "errado". Em termos formais, esse padrão é codificado como lei. A pergunta busca saber se nós precisamos de tal código, seja como lei criminal ou comum, ou consagrado na tradição oral.
Não sabemos quando a ideia de moralidade se desenvolveu pela primeira vez. Nas primeiras comunidades humanas uma sensação de certo e errado teria sido criada pela necessidade, e o objetivo único de sobreviver teria definido os parâmetros dessa necessidade. Nenhuma pessoa que se comportasse de forma a ameaçar a sobrevivência de um indivíduo ou do grupo teria sua atitude tolerada, e lidava-se com esse comportamento inadequado de acordo com a situação. Os padrões de comportamento acabaram sendo desenvolvidos e viraram a norma aceita, seja por uma tribo ou alianças de tribos, e esses padrões teriam sido uma protoética que se desenvolveu como uma série de padrões comuns para um grupo. Partindo desse começo simples, o conceito de "ética" agora se aplica a assuntos especializados como "ética médica" e "ética nos negócios". Especialistas à parte, a ética diz respeito a todos nós, como pessoas que vivem em grupos. Na cultura ocidental a influência dominante é o sistema ético baseado na tradição judaico-cristã, cujo núcleo está nos Dez Mandamentos interpretados no Sermão da Montanha de Jesus. O que isso representava foi absorvido pelo imenso e complexo sistema de leis civis, criminais e eclesiásticas que foram indispensáveis ao desenvolvimento da civilização ocidental.
Nenhuma sociedade conseguiria sobreviver sem um código moral, especialmente uma tão sofisticada quanto a nossa. Sem diretrizes estabelecidas de comportamento e os meios para aplicar as leis que as expressam, seríamos ingovernáveis e reduzidos à anarquia. Como diz Thomas Hobbes (1588-1679), a vida seria "solitária, pobre, grosseira, bruta e breve." Para expressar de outra forma, viver sem nenhum tipo de código moral ou sistema ético exigiria da sociedade a mais extraordinária maturidade, com todos vivendo livremente no melhor interesse das outras pessoas. Obviamente isso não é possível nem provável que aconteça, mas de certa forma todos os sistemas éticos podem ser reduzidos a esse princípio. De forma simples, um sistema ético é uma expressão de respeito, não só de uns pelos outros como pela própria vida em si. De acordo com Albert Schwetzer (1875-1965), "a ética...não é nada além da reverência pela vida. Ela fornece o princípio fundamental da moralidade, ou seja, que o bem consiste em manter, promover e aprimorar a vida, e que destruir, ferir e limitar a vida consistem no mal".
Enfim, a moralidade é uma regra de reciprocidade que, afirmada positivamente, exige que você trate os outros como gostaria de ser tratado,e negativamente que evite tratar os outros como não gostaria de ser tratado. Portanto, reciprocamente, precisamos sim de um código moral e de conduta.



Referências Bibliográficas: 
Nietzsche, Friedrich, Assim falava Zaratustra, Vozes, 2011.
Hobbes, Thomas, Leviatã. Ícone Editora, 2008.












                                                                                                                                              

sábado, 3 de junho de 2017

Fenômeno Lula

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Caberá as próximas gerações, passado o tempo presente, o tempo "quente" fazer o devido julgamento deste personagem político que como Getúlio Vargas tem sido amado por uns e odiado por outros.

Marcelo Rebinski

As ciências humanas nos orientam a separar o indivíduo da figura pública em um personagem histórico. O exercício é essencial para evitar que a análise do contexto histórico seja contaminada por afetos da sociedade da época, dos meios de comunicação e, não raro, do próprio pesquisador. Esse cuidado é necessário, porque é armadilha fácil confundir um homem com uma época, principalmente líderes políticos, religiosos ou personalidades com grande capacidade de mobilização. O que não significa, todavia, que determinado personagem jamais consiga dobrar o curso da História para outra trajetória. O faz, porém, com uma soma de forças e tensões coletivas, que consegue catalisar e dar vetor. 

Nenhum outro personagem recente da história brasileira consegue ser tão exemplar desse constante jogo de forças quanto o ex-presidente Luiz Inácio da Silva. O operário tornado sindicalista, tornado político, tornado presidente representou a ascensão política da esquerda no país e o reposicionamento de toda uma classe social ante um novo projeto de nação.

Lula se tornou um símbolo. Para uns, uniu as lutas de esquerda e criou um projeto político democrático e plural. Para outros, foi a face da sensibilidade para com a miséria e a falta de oportunidades que mitigam parcela significativa do país. E para ainda outros, o chefe de uma suposta conspiração de efeitos maléficos ao Brasil, não obstante a intensa melhora de todos os indicadores econômicos e sociais.

Qualquer que seja o sumário escolhido, tem-se uma atribuição de um fenômeno amplo a um homem. Caberá, portanto, à História fazer a correta divisão entre o individual e o coletivo. Uma tarefa para mais tarde, quando os ânimos e os contextos tiverem decantados.

Até lá, cabe a sociedade, tão somente ensaiar impressões, expressões e conclusões pessoais e não históricas sobre a trajetória de Lula.